*Com revisão de Guilherme Namura

A Educação é um tema recorrente no debate público brasileiro. Muito se opina sobre suas diretrizes estruturais e pedagógicas, mas pouco se compreende sobre as atribuições e responsabilidades de cada ente federativo na efetivação dos preceitos estabelecidos pela Constituição Federal de 1988 em relação à educação. A questão federativa é central na compreensão da educação no Brasil e suas formas de melhor execução orçamentária, financiamento e aprimoramento basilar.

A estrutura federativa na Educação é o assunto do MinutoRelGov desta semana em nosso canal no YouTube:

No último Pisa, avaliação internacional de educação básica promovida pela OCDE e amparada nos eixos de análise de leitura, matemática e ciências, o Brasil amarga baixas posições em todos os três, muito distante de seus parceiros de BRICS China e Rússia

A estrutura federativa na Educação

É evidente a necessidade de aprimoramentos dos processos de aprendizagem e das metodologias utilizadas. Mas tudo isso passa pela compreensão das competências federativas sobre a educação brasileira e do consequente dédalo de financiamento e responsabilidades de cada ente. Este artigo propõe elucidar as incumbências privadas, e coletivas, de cada esfera da administração pública brasileira.

O Sistema Educacional Brasileiro

A Constituição Federal de 1988 é que estabelece o norte de estruturação do sistema educacional brasileiro. A principal característica desse sistema é a institucionalização da colaboração federativa pela delegação de atribuições privativas e comuns a fim de estabelecer uma educação de qualidade que forme o indivíduo, o trabalhador e o cidadão (Art. 205, CF).

Seu entroncamento se dá na concorrência entre competências materiais e legislativas: a execução material fica concentrada nos Estados, Distrito Federal e Municípios, mas o financiamento dos programas educacionais se dá pelo incentivo federal. Já as atribuições legislativas são concentradas no âmbito federal, mas também não são de sua completa exclusividade. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/1996) é a principal estrutura legal sobre o sistema educacional, definindo as atribuições da União, Estados e Municípios.

Atribuições Federais

O âmbito federal se coloca essencialmente como coordenador do sistema educacional, tratando por exemplo do financiamento, distribuição e equalização de recursos entre os entes, assim como da articulação entre os níveis educacionais (Básico e Superior) por meio da edição de normas gerais e suplementares sobre a Educação.

Nessa função de assessoramento também lhe cabe a elaboração do Plano Nacional de Educação, a assistência técnica aos entes para execução integral de seus objetivos educacionais, assim como a elaboração das competências e diretrizes de todos os âmbitos educacionais (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio), sendo o norte das estruturas pedagógicas por meio da consolidação de currículos comuns.

A União também é incumbida do monitoramento de desempenho educacional, compete a ela a promoção de avaliações a fim de observar o rendimento escolar e se há resultado real dos investimentos colocados. Assim identificando falhas e áreas a serem aprimoradas.

Pela falta de uma delegação explícita de competência sobre a área, ficou junto à União a responsabilidade sobre a Educação Superior. Sendo ela a responsável pela coordenação e supervisão das instituições de ensino superior espalhadas pelo país, assim como pelos seus ramos de graduação e pós-graduação.

Atribuições Estaduais e do Distrito Federal

Neste nível de visão sobre o sistema educacional a cooperação se adensa. Os entes aqui colocados têm a capacidade de legislar de forma colaborativa mediante as normas gerais já estabelecidas, baixando apenas normas complementares ou internas ao seu sistema de ensino.

Conforme o artigo 8º da Lei de Diretrizes e Base da Educação (LDB), compete aos Estados e ao Distrito Federal a articulação, junto com os municípios, das formas de colaboração na oferta de ensino fundamental por essa ser uma obrigação compartilhada entre os dois entes e ser transpassada pelas especificações populacionais e de recursos.

O destaque da gestão estadual e distrital está na responsabilidade sobre o ensino fundamental e principalmente ao médio, os últimos anos da educação básica. É sua prioridade a entrega de ensino médio a todos que o demandarem, incluindo o transporte escolar, assim como os cursos e exames supletivos para certificação de conclusão do ensino fundamental e médio.

Também são de sua responsabilidade a salvaguarda de órgãos e instituições oficiais de seus sistemas de ensino e a elaboração e execução de planos educacionais, sempre consonantes com as diretrizes nacionais e tendo o objetivo de integralização com a gestão municipal. Por fim, também lhe é entregue a capacidade de estabelecer educação superior, mas sem prejuízo da sua incumbência prioritária.

O gráfico abaixo, do Censo da Educação Básica de 2019, mostra que a rede estadual tem o maior número de escolas de ensino médio, seguida pela rede privada. Apesar de ser a etapa com maior participação da rede federal, comparada à educação infantil e ao ensino fundamental, ela é ainda muito pequena.

A estrutura federativa na Educação

O gráfico apresenta com objetividade a competência educacional dos Estados e Distrito Federal sobre o ensino médio e indica com clareza a prioridade e obrigação desses entes em oferecer essa modalidade e executar políticas públicas voltadas a este sistema de ensino.

Atribuições Municipais

Aqui repete-se o adensamento da cooperação.  As capacidades de legislação sobre o assunto nesse âmbito da administração pública têm a função de adequamento local a normas já estabelecidas, vindo também com o objetivo de complementação e de ordenação interna do tema.

A responsabilidade municipal de forma prioritária está no ensino fundamental, mas também na educação infantil, os primeiros anos de inserção dos indivíduos no sistema de educação. Assim, é atribuição municipal oferecer e estruturar creches e pré-escolas. Outros níveis de ensino somente podem ser atendidos por esse ente quando sua demanda prioritária estiver plenamente atendida e os recursos estiverem acima dos percentuais mínimos estabelecidos.

Também lhe é delegada a responsabilidade de manutenção de seus órgãos e instituições educacionais junto ao esforço de integralização ao sistema estadual e federal, a capacidade de gerência de redistribuição em relação às suas escolas e o transporte escolar dos alunos da rede municipal de ensino. Dentro do regime de colaboração entre os estados e municípios e com base nos dados do Censo é possível verificar também que o município é o principal responsável pela oferta dos anos iniciais e finais do ensino fundamental. O gráfico abaixo mostra a quantidade de escolas de anos iniciais e finais em cada uma das redes.

A estrutura federativa na Educação

Assim, apesar de uma ausência de definição distinta das responsabilidades para Estados e Municípios sobre o ensino fundamental, os números demonstram a competência prioritária dos municípios em assegurar a sua oferta. Cabe aos Estados deliberar, com os Municípios, formas de colaboração na oferta do ensino fundamental, as quais devem assegurar a distribuição proporcional das responsabilidades, de acordo com a população a ser atendida e os recursos financeiros disponíveis em cada uma dessas esferas do poder público.

Nota-se que os dados apresentados apresentam uma inversão na proporcionalidade na oferta de ensinos entre Estados e Municípios, que reforçam a preponderância da competência da rede municipal em gerir os anos iniciais, enquanto a rede estadual em organizar a educação para estudantes nos anos finais do fundamental. Essa dinâmica complementa a competência dos Estados na oferta do ensino médio.

A Educação Profissional

A Educação Profissional é uma modalidade educacional que propõe se integrar junto ao sistema educacional já estabelecido e intrincado em suas delegações de responsabilidades. Compreendendo-se como parte indissociável da Educação Nacional e trazendo de forma sistematizada o aprofundamento do conhecimento científico-tecnológico, encontrou onde se anexar junto a estrutura da Educação Básica.

Como visto, a Educação Básica é mais atrelada aos entes federados que não a União. Mas, a União incumbiu-se de desenvolver a coordenação desse modelo de educação. Integralizou a missão de unir a Educação Básica, compreendido como o espaço de integralização das diversas modalidades de educação e por isso sendo o terreno mais fértil para seu desenvolvimento, com o modelo de gestão e organização diferenciada que exige a Educação Profissional, sendo sua marca a dualidade estrutural.

Dessa forma se desenvolveram as próprias instituições de ensino profissional, instituições públicas de administração federal que em seu modelo de aprendizagem conseguiram grandes desempenhos tanto na área comum da Educação Básica quanto na área da Educação Profissional, explorando tanto as dimensões da vida social quanto produtiva.

Reforça-se também a relação entre a competência dos Estados em assegurar a oferta do ensino médio em conjunto com políticas voltadas ao ensino integrado, em que as escolas oferecem uma modalidade formal de educação profissional e integram dimensões do trabalho. Neste aspecto, o Ensino Integrado é um sistema que possibilita ao jovem e ao adulto ter uma formação integral em um único currículo, que vai além daquilo que é necessário para o mercado de trabalho ou para o seu processo de escolarização e formação continuada

Conclusão

O sistema educacional brasileiro é estruturado pelos artigos 23 e 211 da Constituição Federal, na compreensão de federalismo descentralizado instituído no Brasil e com certeza não é completamente eficiente. Sua delegação de competências, onde não necessariamente a capacidade de legislar está atrelada a de gerir, pode trazer desencontros à execução plena dos preceitos constitucionais sobre educação.

Mas, designar as prioridades de cada ente para uma área da estrutura educacional auxilia os gestores a compreender seu espaço de atuação e onde devem aglutinar seus esforços, estimulando a descentralização e fortalecendo as políticas de gestão e cooperação que tornam os processos educacionais muito mais observáveis e democráticos. É um sistema que, pode-se dizer, induz o aprimoramento das formas de colaboração dentro do seu próprio organograma.

Assim, ressalta-se o caráter de sobreposição de responsabilidade sobre a área de Educação, onde tanto os Estados como os Municípios precisam assegurar o ensino fundamental por exemplo. A dualidade de competência dos entes federativos tende a provocar confusão e disputa por matrículas entre as redes do país e impacta negativamente no aprendizado dos alunos, qualidade do ensino e nos investimentos das escolas.

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