“TikTok nas eleições municipais”, por Tarek Nassif
Atualmente, as redes sociais têm tanta importância quanto a televisão nas campanhas eleitorais. Fenômenos como Facebook, Instagram, WhatsApp e Telegram se consolidaram como formas de comunicação política, especialmente após a eleição presidencial de 2018, quando Jair Bolsonaro foi eleito presidente da República. No entanto, ao focar nos jovens eleitores, uma plataforma que se tornou indispensável é o TikTok.
O TikTok, conhecido por seus vídeos curtos, divertidos e espontâneos, é especialmente popular entre os jovens. Apesar de ser famoso pelas “dancinhas”, o aplicativo se transformou em uma ferramenta estratégica nas campanhas políticas, sendo considerado um aliado fundamental para pré-candidatos à Presidência, que buscam conquistar esse público.
Dados da própria plataforma indicam que 1 em cada 4 usuários tem menos de 20 anos, enquanto a maioria está abaixo dos 35. Além disso, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registrou um aumento de 14,22% no número de eleitores de 16 e 17 anos em comparação com o último pleito municipal, o que impulsionou a “Tiktokenização” das campanhas, voltadas para atrair esse público jovem.
O sucesso do TikTok como plataforma política pode ser explicado, em parte, pela tentativa de simplificação das questões políticas, com vídeos curtos que condensam temas complexos. Setores da direita, em particular, têm se destacado no uso dessa linguagem, recorrendo ao sarcasmo, ironia e memes. Isso facilita a comunicação com os jovens eleitores, que consomem conteúdos rápidos e acessíveis.
Outro efeito da “Tiktokenização” das campanhas é a criação de bolhas ideológicas ainda mais rígidas. Com algoritmos extremamente eficazes, o TikTok identifica o que prende a atenção do usuário e, em seguida, o alimenta com conteúdos que reforçam essa visão, criando um ciclo contínuo de reforço ideológico. Isso faz com que o usuário se sinta mais seguro em suas convicções, acreditando que sua visão de mundo é a mais confiável, ao mesmo tempo que diminui a exposição a pontos de vista alternativos.
Essa tendência já se consolidou oficialmente nas eleições europeias de 2024, quando o TikTok foi considerado um fator crucial na vitória de políticos da extrema direita, como Jordan Bardella, um astro de 28 anos da plataforma, que obteve o dobro de votos do partido do presidente Emmanuel Macron. Fenômenos semelhantes foram observados em países como Indonésia, Argentina, México e África do Sul, indicando uma tendência global. No Brasil, o impacto do TikTok já está sendo sentido nas eleições municipais de 2024, com um papel crescente na dinâmica política do país.
Dessa forma, a “Tiktokenização” não só amplia o alcance dos discursos políticos, mas também redefine a maneira como as campanhas são conduzidas, com um foco crescente nas redes sociais como campo de batalha eleitoral.
TIKTOK NAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS DE 2024
Candidatos espalhados por todo o Brasil aderiram à tendência global da “tiktokenização”. Com a conclusão do primeiro turno, no dia 6 de outubro, é possível fazer algumas considerações sobre o sucesso da plataforma como forma de comunicação política.
Sem dúvida, um dos exemplos mais bem-sucedidos da utilização da rede social foi o prefeito recifense João Campos (PSB). Apesar das críticas da oposição, especialmente do ex-deputado federal Daniel Coelho (Cidadania) e do ex-ministro do Turismo de Bolsonaro e candidato à prefeitura Gilson Machado (PL), que o acusaram de apresentar uma Recife “maquiada” e de aumentar os gastos em publicidade, o jovem prefeito conseguiu ser reeleito em primeiro turno com a maior votação da história, atingindo 78,11% dos votos válidos.
João Campos é considerado um nativo digital, gravando vídeos espontaneamente e mantendo uma equipe de comunicação jovem e engajada. Seu marketing é centrado no digital, priorizando redes sociais em detrimento das mídias tradicionais e estabelecendo uma comunicação leve e acessível. Essa abordagem ajudou a suavizar sua imagem após momentos difíceis, como a morte de seu pai, Eduardo Campos. Em entrevista ao G1, Jorge Gomes, doutor em ciência política e professor da UFPE, analisa a estratégia de marketing de João Campos, destacando seu investimento em redes sociais e no uso de memes, que aumentam sua visibilidade. Campos implementou políticas públicas visíveis e atraentes, transmitindo a imagem de um prefeito ativo e preocupado com a cidade, o que resultou em uma boa avaliação. Ele também deu continuidade a projetos existentes, aproveitando a equipe técnica das administrações anteriores.
Outro exemplo notável é o do carioca Eduardo Paes (PSD), que foi reeleito em primeiro turno com 60,47% dos votos válidos. Paes liderou o engajamento no TikTok entre os concorrentes, com nove dos dez vídeos mais vistos no início da campanha. O vídeo mais popular, com 1,5 milhão de visualizações, é uma paródia do funk “A Barreira vai virar baile”, adaptado para “O Rio vai virar baile”, onde Paes dança e cumprimenta eleitores. O segundo vídeo mais popular, com 1 milhão de visualizações, apresenta o prefeito ao som do funk “Zona Oeste”, de MC Marcinho, anunciando o início das obras do Parque Oeste em Inhoaíba. Ambos os vídeos utilizam música, humor e hashtags populares para alcançar a viralização.
Marcelo Alves, professor da PUC-Rio, comenta que o sucesso dos vídeos de Eduardo Paes no TikTok se deve à sua adaptação inteligente às características da plataforma, especialmente no uso de humor e leveza, em contraste com a seriedade tradicional da política. Paes demonstra um bom entendimento do algoritmo da rede social e, com sua avaliação positiva como prefeito, possui grande potencial para continuar crescendo nas redes.
Em Florianópolis, Topázio Neto (PSD) foi reeleito prefeito com 161.839 votos (58,49%), superando seus adversários em turno único. Conhecido como “Prefeito TikTok” por sua popularidade nas redes sociais, ele consolidou sua força nas urnas, obtendo mais votos que seu antecessor, Gean Loureiro, que venceu em 2020 com 126.144 votos. Um de seus vídeos mais populares, que ultrapassou 2 milhões de visualizações, mostra-o almoçando em um restaurante popular, incentivando as pessoas a comerem ali, mesmo diante de dificuldades financeiras. Seu perfil no TikTok apresenta vídeos bem produzidos sobre temas como construção de escolas, recapeamento de asfalto e alertas de chuva. Em outro vídeo, que também superou 1 milhão de visualizações, ele divulga uma pista de skate.
A estratégia de comunicação de Topázio Neto nas redes sociais é caracterizada por planejamento meticuloso e intencionalidade, visando criar uma imagem positiva de sua gestão. Seus conteúdos incluem vídeos dinâmicos que o mostram em ação, interagindo com a comunidade, tornando sua imagem mais acessível e jovial. Topázio não se concentra apenas em si mesmo, mas também promove as ações da prefeitura e as qualidades de Florianópolis, atuando como um embaixador da cidade. Ele e sua equipe se adaptam às tendências das redes sociais, utilizando analogias para simplificar conceitos complexos e engajar o público. Além disso, Topázio opta por não responder a ataques políticos, focando em construir uma narrativa positiva sobre sua administração, destacando avanços e soluções para problemas, como a abordagem a moradores em situação de rua e a resposta a casos de corrupção.
Além dos três prefeitos reeleitos em primeiro turno, que se tornaram exemplos do bom uso da rede social como marketing político, há também candidatos que, com o auxílio da plataforma, conseguiram avançar para o segundo turno, como André Fernandes (PL). Com 40,20% dos votos, ele foi o candidato mais votado e enfrentará Evandro Leitão (PT) no segundo turno. O que tornou a campanha de Fernandes impressionante foi seu duelo com o atual prefeito Sarto (PDT) no TikTok. Antes do jingle “É culpa do Sarto”, Fernandes estava atrás de Sarto e do Capitão Wagner (União Brasil), que era visto como o “candidato da direita” durante grande parte do tempo. No entanto, após a viralização nas redes, Fernandes rapidamente assumiu a liderança na corrida eleitoral. O jingle de Fernandes ultrapassou 20 milhões de visualizações no aplicativo, superando a população de Fortaleza e se tornando um hit nacional. Como resposta, o prefeito tentou lançar uma batalha na rede social com “Tem que votar no Sarto”, mas não conseguiu superar seu concorrente.
Em São Paulo, Pablo Marçal (PRTB), o terceiro colocado na primeira parte da disputa, alcançou controvérsias ao utilizar a plataforma para a divulgação de conteúdos que foram considerados desinformação e calúnia. Em 24 de agosto, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo ordenou a retirada de perfis de Marçal usados para monetização, após um pedido da campanha de Tabata Amaral (PSB), devido a suspeitas de abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação para pagar usuários pela divulgação de conteúdos. Mesmo com a suspensão, Marçal continuou a viralizar no TikTok por meio de sua rede de apoiadores, que publicaram cortes de suas aparições.
Além das acusações infundadas relacionadas ao uso de entorpecentes por Guilherme Boulos (PSOL), Marçal também amplificou falsas acusações de estupro contra José Luiz Datena (PSDB) durante um debate, levando à famosa “cadeirada”. Aproveitando a confusão, Marçal postou trechos do debate que viralizaram com milhões de visualizações. Em outra ocasião, ele comparou a agressão que sofreu a atentados contra Bolsonaro e Trump e, em uma live no hospital, mudou suas acusações, chamando Datena de “agressor de mulheres”.
Assim, o uso do TikTok se revela um campo complexo e multifacetado nas campanhas políticas, onde a linha entre a promoção legítima e a desinformação pode se tornar bastante tênue.
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