Um dos acontecimentos que mais gerou atenção no meio político nos últimos dias, além de debates entre os profissionais de relações governamentais, foi a aprovação da Medida Provisória (MP) 1154/23, que confirmou a estrutura administrativa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A votação do texto pelo Congresso se deu poucas horas antes de a medida perder sua validade.

O impasse que se instalou em torno da votação da MP 1154 motivou reflexões sobre a tramitação das MPs, o que é uma oportunidade para conhecermos melhor esse mecanismo – e vermos o quanto ele se envolve nas atividades de relações governamentais.

As medidas provisórias estão previstas na Constituição, em seu Artigo 62. O texto diz: “Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”.

A exigência de “relevância e urgência” nem sempre é cumprida. Nos últimos anos, presidentes editaram MPs sobre temas que não exatamente se encaixam nesses requisitos, como uma sobre carteirinha estudantil digital e outra sobre a região metropolitana do Distrito Federal.

Mas, independentemente do teor do texto, todas as MPs têm o mesmo poder e seguem o mesmo rito de tramitação.

A MP nasce por iniciativa exclusiva do presidente da República.O chefe do Executivo é o único com poder de elaborar uma MP, e o faz de maneira livre, obedecendo os requisitos constitucionais.

A partir desse primeiro passo a MP já passa a ter validade. Ou seja: o texto “sai” do gabinete presidencial com força de lei, devendo ser obedecido por poder público e sociedade.

Mas essa validade tem prazo. A MP “existe” por 60 dias, podendo ter o prazo prorrogado por outros 60.

Aí entra uma palavra que frequentemente aparece no noticiário e chega a soar engraçada, mas é um conceito bem relevante para a compreensão do processo: caducar. No contexto jurídico, caducar significa perder a validade sem que haja uma deliberação específica a respeito, mas apenas por uma questão temporal. A MP caduca se seu prazo for expirado e os passos necessários para sua efetivação não forem cumpridos.

Esses passos em questão são dados exclusivamente pelo Congresso Nacional. Os deputados federais e senadores avaliam as MPs e decidem se querem transformá-las ou não em uma lei definitiva. Isso se dá inicialmente por meio de uma comissão formada por 12 deputados e 12 senadores. Essa comissão tem um relator que indica um dos três caminhos para a MP: sua aprovação na íntegra, sua rejeição na íntegra ou, o que é mais habitual, a aprovação por meio de uma nova figura jurídica – o Projeto de Lei de Conversão, de sigla PLV.

Os PLVs permitem aos congressistas apresentarem suas sugestões sobre as MPs, o que pode levar a mudanças significativas na redação e no objetivo final do texto. A MP 1154 foi alvo disso – o deputado Danilo Forte (União-CE) apresentou uma emenda sugerindo que o Congresso passasse a ser uma espécie de revisor do trabalho das agências reguladoras. A proposta não foi acatada.

Depois da discussão pela comissão, que é onde são apreciadas as emendas, a MP (ou seu PLV correspondente) é votada pelos plenários de Câmara e Senado. Se aprovada pelas duas casas passa a ser uma lei, de modo definitivo.

A tramitação de uma MP é um processo em que ocorrem muitas discussões, muitas apresentações de interesse e negociações políticas. A decisão de votar ou não a MP é exclusiva do Congresso – ou seja, o presidente da República precisa contar com a boa vontade dos comandantes de Câmara e Senado para garantir a efetividade do seu texto.